quinta-feira, 29 de maio de 2008

mas e talvez

É, acho que dessa feita terminamos de fato. Após semanas de desentendimentos e distanciamentos em todos os sentidos, acho que meu namoro acabou mesmo. Pelo visto, depois dos últimos e-mails que trocamos, ele não me escreve mais e nem eu a ele.
É triste esse fim, mas pelo menos ainda não estávamos nos odiando, creio eu. Espero que ele não me odeie. Definitivamente eu não o odeio. Eu gosto muito dele, na verdade, mas não o bastante pra viver um desses romances no qual o par de protagonistas passa séculos separados e depois de mil e uma desventuras se encontram e ainda se amam loucamente. Talvez na era anterior à Internet, à velocidade de transmissão da informação em tempo real, globalização e etc. etc. etc., enfim, tudo o que dá uma velocidade vertiginosa ao nosso mundo e faz com que essas idéias românticas não mais persistam na minha cabeçona de mamão, tudo isso me diz que já estava na hora de colocar um ponto final. Mesmo que seja triste. Sempre é triste quando estórias que começaram bem simplesmente acabam. É triste eu não poder ficar mais pensando nele. É triste.
E, no entanto, sinto-me estranhamente confortável dentro dessa tristeza. A Tristeza minha conhecida velha de guerra. E tem também um suspiro de resignação, daqueles suspiros de quem balança a cabeça consentindo pra si mesmo em sinal de que não era mesmo pra ter sido... Eu já estava acostumada à Solidão muito antes dele. Ele me fez fazer uma breve pausa, e foi boa esta pausa, este tempo. O tempo que foi bom, foi bom. Agora estava complicado demais, sofrível demais. Talvez um dia a gente se reencontre e tenha a oportunidade de cutucar nestas feridas que agora são recentes mas que, então, já estarão velhas e fatalmente fechadas. Não conto muito com isso não, mas...
Este é um texto de mas e talvez.
Desde o desentendimento – ou acerto – final, meus dias têm sido exatamente iguais aos anteriores. O mundo não pára. Eu não paro. Há uma certa apatia nisso tudo que já vinha de antes. De dias e dias atrás. A vontade de não sair de casa. A vontade de simplesmente dormir e ficar deitada no quarto incomunicável por mais tempo possível. Isso não tem nada a ver com ele ou com o fim de nós. Sou eu. Eu mesma. Eu e minhas crises e surtos. Eu e a minha fadiga de esperar, de compreender, de aceitar, de contemporizar, de relevar, de tolerar. Cansei de tudo isso. Cansei da vida mesmo. Mas não é que a vontade de morrer voltou, é só que eu queria poder tirar um tempo pra mim. Eu comigo mesma. Eu sozinha. Aí, sozinha, não precisaria tolerar, contemporizar, relevar, aceitar, compreender nada de ninguém. Não precisaria fazer cara de quem está realmente envolvida nas atividades cotidianas. Nada de conversas com colegas de trabalho, alunos e até com minhas amigas. Eu só queria dormir um tempão, hibernar como um urso e acordar em plena primavera, essa primavera que tanta gente sente ao seu redor. Eu queria um dia me sentir em plena primavera. Acho que já me senti. Acho que já acordei um dia, um dia qualquer, um dia sem absolutamente nada de especial, sem nenhum evento, aí acordei e me senti bem. Suficientemente bem pra querer levantar da cama e ver o mundo. Acho que sim. Normalmente eu sinto é um vácuo ao meu redor. Eu sou uma ilha cercada pelo nada. As outras pessoas lá longe, onde eu quase não posso vê-las. Mas eu não aceno. Eu não mando recados em garrafinhas na água. nada de SOS, nada de fogueira. Nada. Considero esta distância boa pra todo mundo, pra mim e pras pessoas. Muitas vezes não sinto ninguém realmente próximo à mim, nem mesmo as pessoas que eu amo. E amor tem a ver com proximidade? Se tivesse, eu seria obrigada a revogar por decreto o meu amor à parte da minha família que eu amo porque quase ninguém é realmente próximo à mim. Esta parte que eu amo na minha família não faz idéia de quem eu sou. E é bom que continue assim.
Algumas amigas e amigos estão habituados com certos aspectos do meu comportamento, mas isso também não significa que me conheçam. Eu me conheço o bastante pra saber que sou legal, mas muito complicada. Entendo perfeitamente porque as pessoas podem ter preguiça de conviver comigo porque sou muito cheia de manias e métodos e tantas coisas loucas passeando o tempo inteiro pela minha cabeça como se fossem satélites em órbita non stop.
Mary disse que já era hora d’eu procurar terapia. Bem, acho que esta hora existe desde quando eu me percebi na infância, quando eu entendi porque eu era diferente, porque minha família era diferente. E se já se passaram mais de 20 anos dessa descoberta, mais outros 20 podem passar porque não tenho a menor intenção de sair desenterrando meus defuntos que tive tanto trabalho pra deixar no esquecimento, na massa amorfa intitulada vagamente como minha infância. Deixa isso pra lá, eu disse a ela. E digo e repito à mim mesma quando venho com essas idéias de me questionar.

Ainda não mudei nada que é dele do lugar. Tudo deve permanecer assim como está até que o sentido dele se perca. O gostar ainda é muito presente pra eu me atrever a apagar fotos do computador, retirar presentinhos e lembrancinhas da estante e da memória. Melhor deixar começar de dentro pra fora. Quando a imagem dele for esmaecendo em mim, aí eu retiro seus vestígios visíveis aos olhos, coloco-os fora do alcance. Ainda não tenho vontade alguma de fazer isso. Com os dois ex foi rápido, porque eu estava magoadíssima, então tratei de arrancar tudo do lugar prontamente. Infelizmente o esquecimento não veio assim de pronto...
Pelo meu árduo aprendizado com os traumas anteriores, não dá pra querer apressar o passo quando o assunto é dor-de-cotovelo. Ainda mais porque eu sei que não adianta ficar repetindo que preciso esquecê-lo. Eu sei que tudo acaba um dia e que a gente, eventualmente, acaba por esquecer, então deixarei à cargo do tempo. Não há borracha que apague de uma hora pra outra tanta história, tantos momentos, mesmo os ruins que eu definitivamente gostaria de deletar. Só o tempo. Como eu não pretendo dar colher de chá á meus aspectos mais auto-destrutivos, não falarei mais sobre o assunto. Posso até pensar recorrentemente sobre isso, mas tentarei desviar minha atenção pra outro rumo porque o Tempo não fará milagres sozinhos. Nem que seja na base do faz-de-conta que não estou tendo este pensamento que estou tendo, agora o caso dá-se por encerrado e eu, mais uma vez, recolho meus sentimentos pra balanço geral. Porque a reflexão é mais que necessária. Pensar, ainda que um ato sôfrego, é necessário. É preciso exorcizar muita coisa, passar por uma catarse mesmo. E já que não tenho o Teatro grego, faço de minha própria vida minha tragédia pra ver se consigo a bendita da catarse final. Sou o coro, os personagens e os espectadores. E quem mais poderia fazer isso por mim? Só eu posso pensar sobre minha vida com uma profundidade sado-masoqusita... Só eu posso esmiuçar cada detalhe sórdido, cada dor, cada mesquinharia, cada pequenez do meu próprio caráter. E só eu sei o valor que cada sorriso meu tem. Só eu sei o quanto me custa ser uma boa pessoa. Ninguém pode admirar mais que eu própria minhas virtudes, minhas qualidades. Só eu sei o meu percurso, minhas dores, minhas conquistas. Só eu posso ser meu juiz e meu carrasco. Só eu. Assim como eu deixo pra cada um a tarefa de ser seu algoz ou salvador. Não quero dizer a ninguém como viver sua própria vida. Eu ainda estou descobrindo como viver a minha e ter um pouco de paz, como é que posso apontar o dedo na cara de qualquer pessoa e dizer o que é certo e o que é errado se tantas vezes eu optei conscientemente pelo errado só pra desfrutar da experiência?!
Eu aprendi muitas coisas nos últimos anos, e nem todas foram boas, muito pelo contrário, algumas foram ruins pra mim. Algumas me fizeram mais amargurada do que eu precisaria ser. Algumas me forçam a ter que lutar comigo mesma pra manter alguma esperança nos benditos “dias melhores”. Como é difícil manter a fé em dias melhores! Esta sim, pra mim, é uma tarefa hercúlea! Sou uma mulher de pouca fé. Eu teria renunciado Jesus, Buda, Oxalá, qualquer um, pó muito pouco. Ter fé era uma das minhas resoluções de ano novo que foi mais facilmente descartada... Pessoas de pouca fé não podem mesmo conseguir manter um namoro à distância. Triste isso, não?
Lembro-me que, na segunda, assim que mandei o último e-mail pra ele, na rádio câmara começou a toca a versão de Insensatez com o Tom Jobim e o Sting. Tão bonita a música. E tão verdadeira. “what can one say when a love affair is over?”. Sempre achei que essa música era feita pra mim, mas antes a perspectiva era outra. Eu sempre fui a vítima porque eu sempre me vitimizei. Até na interpretação das músicas! Eu sempre me sentia abandonada, desprezada. Não é que agora eu tenha começado a abandonar e desprezar, é que eu percebi que não sou vítima porra nenhuma, e se for, sou de mim mesma. A vida não tem nada a ver com meus problemas. Ninguém tem. Só eu mesma que não me coloco na linha. Porque eu prefiro andar sozinha. Dá menos trabalho. Amar e ser amada dá muito trabalho.
Estou na fase de ainda achar que toda vez que o telefone toca pode ser ele... Preciso começar a praticar a idéia de “um dia de cada vez”, aí estarei salva...